4ª Mostra de Cinema de Hong Kong em reportagem

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Numa cooperação entre o Hong Kong Economic and Trade Office in Brussels e a Zero em Comportamento, a 4ª Mostra de Cinema de Hong Kong foi inaugurada no passado dia 9 de Janeiro no Cinema City Classic Alvalade.  Nesta edição conhecemos um pouco mais da história de Hong Kong, em particular as suas lendas e batalhas fervorosas do antigo império. Descobrimos também histórias sobre os valores morais que unem uma família, a gratidão, o zelar por quem quem já zelou por nós. A busca pelo amor quer seja em lutas de espadas, usando poções mágicas ou velhos truques de engate. Vimos mães que vendem filhos, e outras que por amor os recebem. Conhecemos atletas olímpicos, imperadores, polícias e burlões.  Entrem nesta reportagem, vamos conhecer um mundo novo!

O filme inaugural, A Simple Life, de Ann Hui, pôs a fasquia desta Mostra bem no alto. Esta obra é um testemunho dos valores morais tradicionais de gratidão e da importância da família, valores por vezes menosprezados nos filmes do mundo ocidental. Numa dedicatória de um homem à senhora que trabalhou para a sua família durante varias gerações, com um representações notáveis de Andy Lau e Deanie Ip, de grande veracidade, este filme prova que não é necessário uma família ser disfuncional para captar a atenção do público e ser objecto cinematográfico.

A simple life

No segundo dia da mostra a programação muda de rumo, apresentando Overheard 2,  a sequela de Overheard, realizado por Alan Mak e Felix Chong e interpretado por Daniel Wu, Louis Koo e Ching Wan Lau. Trata-se de um thriller de acção sobre um corretor financeiro de sucesso que se vê envolvido num acidente, apercebendo-se aí que este estava a ser observado por um militar que pretende destruir o seu conglomerado financeiro. Um filme com bom ritmo e um argumento sólido, premiado em vários festivais internacionais.

Floating City, de Yim Ho, deu início à sessão dupla de sexta feira. O filme decorre entre a década de sessenta, durante os motins contra o imperialismo britânico, e os anos noventa, numa Hong Kong capitalista. Floating City retrata a luta do jovem Bo Wah-Chuen (Aaron Kwok) que consegue pelo seu esforço chegar  a um cargo de executivo de topo na Companhia das Índias de Leste, em Hong Kong. Atravessando o percurso de Bo, que passou a sua infância a ser ostracizado pela sua origem meio chinesa meio britânica e na sua adultez continua a ser limitado pela sua origem humilde, mostra sempre muita resiliência para lutar por um futuro diferente. Bo pertence a um grupo étnico de nome Tanka, cuja tradução literal seria “habitantes dos ovos”, termo que entrou em desuso por ter ganho uma conotação depreciativa pelos chineses. É bastante claro o papel basilar da educação como valorização profissional e pessoal, ficando a lição de que nunca é tarde para acreditar e aprender, encarnada na personagem da mãe (Bau Hei-Jing) que, inspirada pelo seu filho, vai aprender a ler e a escrever. As cenas de sobreposição de imagens dos símbolos chineses com o seu verdadeiro significado proporcionam alguns dos momentos mais belos do filme.

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As diferenças de classes sociais são abordados no filme através da dificuldade do personagem principal em se posicionar no meio das regras e convenções da elite, dificuldades essas que Fion (Annie Liu) tenta ensinar numa alusão explicita a My Fair Lady. Mas a subida de extracto social tem o seu preço. Se, por um lado, um salário confortável pode ajudar parte da família, a sua própria mulher acaba por ser negligenciada em detrimento da conquista profissional. Apesar do argumento sólido e muito interessante, Aaron Kwok não tem uma interpretação convincente, mostrando-se bastante inexpressivo e superficial.

A última sessão da noite fez-nos retroceder à queda da dinastia Quin através de White Vengeance, de Daniel Lee, uma mega produção de um épico de guerra. Um guarda roupa luxuoso e cenários faustosos servem de base a batalhas monumentais e, sem dúvida, a direcção de arte é a componente mais forte do filme. Um jogo de poder e lealdade será disputado numa partida de weiqi (um jogo de tabuleiro inventado na China que remonta há mais de mil anos atrás, anterior ao xadrez) entre as duas facções que querem ocupar o lugar de Imperador.

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O filme perde força nos aspectos técnicos, com a repetição exagerada de flashbacks que nos repetem cenas já vistas para fechar pontas soltas no filme (que muitas vezes não precisavam ser fechadas), em detrimento de outros momentos onde tudo ocorre a uma velocidade excessiva. Outro ponto fraco são os planos panorâmicos das batalhas, por vezes conjugados com zoom outs desproporcionados que, para além de aumentarem a área de cenário deserto no ecrã, não têm qualquer propósito. Para além disso, a fase final do filme, ao seguir exaustivamente cada uma das personagens, faz parecer que o filme precisava de ser editado uma vez mais.

white_vengence01O quarto dia da mostra começou com Love Lifting um filme de Herman Yau Lai-To, que conta uma história inspirada em factos reais de uma rapariga (interpretada por Elanne Kong Yeuk-Lam, cantora e estrela chinesa) que praticava halterofilismo mas que é afastada da competição profissional devido à diabetes. Tudo muda quando, anos mais tarde, o seu marido (Chapman To Man-Chat) a incentiva a perseguir o seu sonho. Mais uma vez, interpretações não demonstram profundidade, ainda que na toada leve e optimista do filme tal não perturbe, quando tudo se torna mais cinzento Elanne não consegue passar a intensidade que o argumento pedia.

Love Lifting

O segundo filme do dia foi um colosso visual. The Great Magician, de Derek Yee, reporta aos anos 20 de Pequim, com todas as cores vibrantes e o encanto da atmosfera de espectáculos de magia, no palco e fora dele. Este é um filme sobre a busca da perfeita ilusão, a que nos inebria na sua falsa felicidade. Com certeza um dos melhores filmes da Mostra, com bons efeitos visuais, bom ritmo narrativo e um argumento cativante, apoiado em boas interpretações no estilo comédia.

the great magician

No último dia aceleramos com The Detective 2, de Oxide Pang, um filme de acção que mistura de forma interessante o bom e o vilão que habitam dentro do ser humano através da história de um ex-polícia tornado detective e que, ao investigar os crimes de um assassino em série, é confrontado com os seus próprios fantasmas.

The Cure, de Bill Yip, marcou o enceramento da mostra, levando-nos com Eric Chiu, no papel principal, até às terras longínquas de Banguecoque,Myanmar e Pai, numa viagem de amadurecimento e de reavaliação de quem somos, do que gostávamos de ser e nos podemos tornar. Um road movie muito bem conseguido, que nos faz questionar as armadilhas da sociedade contemporânea, se queremos mesmo viver mais e melhor, mais bonitos e mais poderosos,e  que nos fazem acreditar cegamente em cápsulas de esperança, para uma felicidade construída sobre castelos de areia. O filme também aborda um tema patente em Floating city: o papel da maternidade ou o que é ser mãe no sentido mais profundo da palavra.

cure

Nada melhor do que uma cura para terminar a mostra de maneira positiva e revigorante. O evento tem tido crescente notoriedade, cumprindo de forma exemplar a sua função de divulgação de filmes que, de outro modo, não seriam exibidos em Portugal. Com mostras de cinema de outros cantos do mundo, o cinema reforça a sua capacidade de fazer sonhar mais longe e melhor, integrando diferentes culturas e experiências enriquecedoras que nos permitem viajar a um preço módico e em cadeiras confortáveis.

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