Festa do Cinema Francês 2014: «A Caminho da Escola» a persistência é a palavra-chave

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Vivemos num mundo dito desenvolvido, onde tudo está facilmente ao alcance de todos, mas esse mesmo mundo caiu numa armadilha, como numa parábola: o filhinho rico deixou de dar importância às coisas fundamentais e, cego pela sua vaidade, trocou a palavra EDUCAÇÃO pela FAMA. A caminho da escola, de Pascal Plisson, é um documentário que coloca tudo em perspectiva e mostra-nos os desafios que jovens em quatro zonas distintas do globo têm de superar apenas para chegar à escola. A educação representa uma oportunidade, permite muitas vezes quebrar o ciclo de pobreza arranjando um emprego melhor ou tendo acesso a bolsas para estudar no estrangeiro. Aprender significa poder realizar sonhos como “ser médico para curar outras pessoas como eu”, como diz Samuel (Índia), que para chegar à escola necessita da ajuda dos seus dois irmãos para empurrarem a sua cadeira de rodas durante mais de uma hora, por caminhos de terra e de água. Em quatro narrativas paralelas vamos descobrindo também a história de Jackson e a sua irmã (Quénia), que percorrem diariamente 1h30 a pé, Carlito e a sua irmã (Patagónia), que vão de cavalo ao longo de 18 quilómetros, e Zahira (Marrocos), que faz um percurso de 4h a pé pelos caminhos íngremes da montanha. A caminho da escola leva-nos a uma realidade também paralela à nossa, onde em vez de minutos falamos de horas de trajecto, em vez de transportes falamos de pés cansados, joelhos com feridas e roupas sujas. A paisagem não é de cimento como prédios e estradas, mas sim vales e montanhas (Marrocos e Patagónia), ou planícies com elefantes e zebras (Quénia). Estes bravos heróis desafiam a sua própria vida para irem aprender, e mesmo depois de um desafio físico extenuante Carlitos mantém um espírito atento e participativo, Jackson vai orgulhoso pela responsabilidade de ser o dia em que vai hastear a bandeira e Samuel sente-se um privilegiado por poder vir à escola apesar da sua reduzida mobilidade, denunciando outros casos em que os pais desistem de proporcionar uma educação aos seus filhos. O realizador é também hábil ao mostrar o papel preponderante destes pais, que rezam pela segurança dos seus filhos até à escola, que lhes estimulam o gosto por aprender e para que sejam os melhores da sua turma. Ao som de uma banda sonora que adensa (mais do que habitualmente acontece em documentários) ora o perigo ora a aventura de cada caminho, com planos extremamente abertos que enquadram os protagonista na imensidão geográfica em que se encontram e outros muito fechados, mostrando quanto sofrem os seus pés ao longo do caminho, este filme é uma delicia para os olhos e ouvidos mas ao mesmo tempo um murro no estômago. Documentário inspirador, que mostra a fibra, a coragem e a persistência destes pequenos grandes seres humanos que se desafiam todos os dias pela paixão da educação.
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Apesar de vermos Zahira e as irmãs de Jackson e Carlito a ir à escola, muitas são as raparigas que não vão porque os pais apenas enviam os filhos rapazes, injustiça que o documentário falha em abordar. Muitas vezes não é só a dificuldade geográfica que faz as amigas de Zahira não irem à escola, mas o factor género também é importante. Ao ouvir Samuel dizer que quer ganhar muito dinheiro para comprar muitas coisas, vemos a projecção dos valores ocidentais da importância do dinheiro e a grande conclusão é que tudo isso pode ser uma falácia. Todo o conforto material que os países ocidentais conquistaram traduziu-se em oportunidades, em bolsas, em investimento no ensino superior, mas por outro lado as desistências nas escolas também aumentaram, as más notas e a falta de entusiasmo dos jovens é um problema comum. Será inevitável questionar porque não é possível juntar o entusiasmo e alegria destes guerreiros às facilidades instituídas que os países desenvolvidos oferecem?

 Classificação (0-10): 9

 

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