Com o fim-de-semana à porta, a sexta-feira no DocLisboa’15 guardava uma das obras mais tocantes do programa. They Will Have To Kill Us First: Malian music in exile, sessão que contou com a presença da realizadora Johanna Schwartz, é um dos documentários mais profundamente realistas acerca de como é viver sob o regime do auto-proclamado Estado Islâmico, naturalmente difícil de registar porque acontece neste preciso momento. O ângulo é o da cultura, mais especificamente da música, proibida em função da charia imposta pelo ISIS na região norte do Mali, tanto de ser tocada como de ser reproduzida e escutada. Graças à resistência heróica de artistas cuja vida não faz sentido sem música e pela qual estão dispostos a morrer, Schwartz consegue captar de modo comovente o significado concreto da expressão “a arte é uma arma”. Quase todos os protagonistas foram forçados ao exílio, mas nunca deixaram de lutar pelo direito à expressão artística que é sempre, em última análise, também política. Tecnicamente impecável e com uma banda sonora elevada a personagem de destaque, They Will Have To Kill Us First: Malian music in exile é o perfeito complemento do filme Timbuktu (nomeado a um Oscar) para compreender dramas do mundo actual: não apenas o do Mali por eles abordado, mas também o de outras geografias que pela violência armada se tornaram locais de impossível existência pacífica, permitindo ao espectador maior empatia face à questão tão actual dos refugiados.
Para quem não teve oportunidade de assistir à primeira exibição de Frank Zappa: Phase II – The Big Note, a tarde do último sábado do DocLisboa’15 ofereceu nova possibilidade, desta feita com a presença do realizador Franz Scheffer, que se prestou a contar mais sobre o seu trabalho em torno do mítico músico (mais sobre esta conversa aqui). A principal impressão relativamente ao filme é a falta de foco que deriva da enorme ambição em cobrir um território tremendamente vasto como é o da criação artística de Frank Zappa. Por um lado é preciso elogiar o esforço para construir algo abarcante (convém lembrar que este é apenas um de três filmes que Scheffer realizadou sobre Zappa), mas fica a sensação de inevitável dispersão ainda que em todo o momento o retrato e a homenagem sejam mais do que dignos.
À noite, a sessão de encerramento ficou ao cuidado de El Botón de Nácar, poderosa obra poética partindo de dois misteriosos botões encontrados no fundo do oceano que, para o realizador Patricio Guzmán, comporta a história de toda a humanidade. A costa chilena, a água, as estrelas ou os indígenas da Patagónia são apenas alguns pontos de ancoragem para uma bela e introspectiva viagem sobre os mistérios do planeta Terra,parceiro ideal do seu anterior filme Nostalgia de la luz. No domingo chegou ao fim a edição 2015 do DocLisboa e as atenções viraram-se principalmente para os filmes premiados (ver listagem completa aqui), alguns deles com direito a sessão suplementar. Para o ano Lisboa cá estará uma vez mais para acolher o mundo inteiro. Até lá!